28/02/2023
São José do Rio Preto ganha fazenda-modelo para reduzir emissão de gases do efeito estufa na agropecuária
Conheça
os sistemas ILPF, ILP, IPF e ILF que já são apostas para tornar as fazendas
brasileiras mais sustentáveis

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Na plantação de soja: Renata Branco, responsável pela fazenda rio-pretense que promete ser modelo para o Brasil
Uma fazenda com rotação em uma mesma
área entre atividades agrícolas e pecuária e onde vacas leiteiras e o gado
descansam à sombra de árvores. Esse é o perfil da propriedade rural
rio-pretense que promete ser modelo para agropecuaristas brasileiros na redução
da emissão de gases do efeito estufa.
Situada na divisa entre Rio Preto e
Mirassol, a fazenda administrada pelo Instituto de Zootecnia (IZ-APTA), da
Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, por meio de
parcerias com a iniciativa privada, funciona como uma espécie de laboratório
para pesquisadores brasileiros descobrirem como tornar a pecuária mais
sustentável.
O Centro Avançado de Pecuária
Sustentável, que deve ser inaugurado até o final de 2023, conta com
laboratórios de pesquisa e uma área de aproximadamente 220 hectares, em que
pesquisadores estão iniciando a aplicação do sistema produtivo que promove a
integração lavoura com a pecuária (ILP).
O modelo produtivo, que já é aplicado
em propriedades rurais brasileiras, será alvo de estudos que visam popularizar
entre os agricultores e pecuaristas brasileiros os benefícios de unir grãos,
bois e árvores em uma mesma propriedade.
“Queremos ser a casa do pecuarista, o
local onde ele pode tirar as dúvidas. Além de comprovar por meio de estudos a
rentabilidade e os inúmeros benefícios do sistema de integração
lavoura-pecuária. Já temos pesquisas sobre o ILP, mas, em Rio Preto, queremos
concentrar os estudos e fazer dessa fazenda um modelo para o Brasil”, diz
Renata Branco, pesquisadora do Instituto de Zootecnia e responsável pela
fazenda.
Na prática, o consórcio lavoura e
pecuária da fazenda de Rio Preto funciona assim: no primeiro momento, após o
plantio da soja, funcionários vão realizar a colheita e comercialização do
produto. Em seguida, áreas onde estava a soja vão ser preparadas com o pasto.
Por fim, entra o rebanho. “Vamos intercalar lavoura e pecuária durante cinco
anos. Depois pretendemos usar a floresta e adotar o modelo completo de
integração lavoura-pecuária-floresta”, explicou Renata.
Além de sustentar os animais no
período seco, tornando a fazenda mais produtiva durante todo ano, o consórcio
lavoura-pecuária melhora a qualidade do pasto que, consequentemente ao estar
bem manejado, sequestra carbono da atmosfera, compensando as emissões dos
bovinos, que são geradores de metano – um dos gases do efeito estufa
responsável pelo aquecimento global.
“Essa integração possibilita inúmeros
benefícios ambientais, produtivos e econômicos para o produtor. Isso porque
aumenta a quantidade de carbono no solo e oferece uma melhor pastagem para o
gado. No Brasil, temos uma característica de muito pasto no verão e pouco no
inverno, com o sistema de integração existe um equilíbrio”, apontou José
Ricardo Pezzopane, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste, em São Carlos (SP).
Embora o modelo ILP já seja aplicado
em propriedades rurais do Brasil, na fazenda rio-pretense a diferença são os
três cenários montados pelos pesquisadores: um intercalando soja-bovino; outra
somente com a plantação de soja e correções nitrogenadas; e uma terceira área
da fazenda com o cenário que, normalmente, é encontrado nas propriedades
rurais, de ter somente a lavoura ou pecuária, sem correções nitrogenadas.
“Com os três cenários, vamos fazer uma
comparação de qual área mais emite gases do efeito estufa, onde houve maior
mitigação de carbono e qual foi mais rentável economicamente. Queremos tornar a
pecuária ainda mais sustentável do que ela é através dos resultados obtidos
nesta fazenda”, afirmou Renata.
Boi
na sombra aumenta a produtividade
Tornar a pecuária mais sustentável é
apontado como um dos principais desafios do Brasil para cumprir os acordos
climáticos de redução de gases do efeito estufa (GEE). Além do setor de
transporte, principal fonte de poluição em Rio Preto, o crescimento do rebanho comercial
bovino da região também coloca a agropecuária no pódio dos maiores emissores de
GEE do Noroeste Paulista, segundo levantamento do Observatório do Clima.
É neste cenário que o modelo de
integração lavoura-pecuária-floresta ganha força ao ser uma alternativa para
tornar a pecuária mais sustentável através do sequestro de carbono. Isso porque
estudos na fazenda rio-pretense querem mensurar em quanto a lavoura e a
floresta podem mitigar a emissão de gases do efeito estufa da pecuária – que
lança o metano na atmosfera através do seu processo digestivo.
"O sistema de integração colabora
de duas maneiras: o primeiro é que ao adotar uma prática que faz o animal comer
melhor, pois o pasto está em melhores condições devido a rotação
lavoura-pecuária, o animal emite menos gás metano. Além disso, ao melhorar a
pastagem você pode sequestrar mais carbono. Por fim, um segundo benefício, é
que através da integração você produz mais e diminui a expansão agrícola. Ou
seja, você produz mais em uma área que produzia menos”, afirmou José Ricardo
Pezzopane.
Para se ter uma ideia, uma pesquisa da
Embrapa mostrou que árvores em sistemas integrados acumulam até oito toneladas
de carbono por hectare a cada ano. No estudo, foram analisados eucaliptos,
componente arbóreo mais comum de ser aplicado nas fazendas com ILPF no Brasil.
Marcos Silveira Bernardes, professor
da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" (ESALQ) da
Universidade de São Paulo (USP), lembra que a sombra das árvores dão conforto
para os animais e consequentemente aumenta sua produtividade. "Além da
sombra beneficiar o animal, uma outra vantagem é que o solo do interior de São
Paulo não é tão fértil como de lugares frios, mas com a sombra das árvores
possível pelo sistema de integração você melhora o solo”.
Outros benefícios apontados pelo
pesquisador são que o animal fica menos suscetível de ficar doente e existe
aumento da biodiversidade ao redor da propriedade rural. “O sistema de
integração somente não é mais frequente nas propriedades rurais do Brasil por
falta de conhecimento, pois você tem que saber sobre lavoura, pecuária e até
floresta”.
Apesar de parecer recente, o modelo
integrando lavoura-pecuária-floresta (ILPF) é comum em outras partes do mundo,
como China, Tailândia. “O que chamamos hoje de ILPF já existe há muitos anos e
foi consagrado pela comunidade primitiva. Nos últimos vem ganhando força no
país”, ressaltou o professor Marcos Silveira Bernardes da USP.
No Brasil, dados da Rede ILPF apontam
que houve aumento de 52% das áreas com sistema de integração no Brasil, entre
2016 e 2021, de 11,5 milhões de hectares, em 2016, para 17,5 milhões de
hectares em 2021, sendo que a maioria adota o sistema integração
lavoura-pecuária.
Manejo
eficiente contra emissão
Além do sistema de integração, a
fazenda-modelo de Rio Preto também conta com laboratórios que vão começar a
funcionar até o fim de 2023. O objetivo é que além do sistema de integração, a
propriedade busque alternativas para diminuir a emissão de gases do efeito
estufa pela agropecuária, seja através de melhoramento genético de bovinos,
novos aditivos naturais ou estudos sobre a fermentação ruminal.
"A expectativa é que o novo
centro auxilie o estado de São Paulo a colaborar com o plano estadual de
neutralidade climática. Além de ajudar o Brasil a cumprir com o acordo feito na
COP26, juntamente com mais de 100 países, em reduzir a 30% as emissões dos
gases de efeito estufa, com base nos dados de 2020”, explicou Renata Branco.
Entre os benefícios já comprovados
propiciados pelo modelo de integração estão a otimização da ciclagem de
nutrientes no solo e a maior eficiência na utilização de recursos naturais.
“Com os laboratórios pretendemos aplicar o conhecimento prático e teórico em um
mesmo lugar. Com o objetivo de facilitar a entrega de novas tecnologias a toda
cadeira produtiva. Ou seja, vamos estudar o sistema de integração, mas também
outras tecnologias nos laboratórios”.
Segundo Renata, na fazenda de Rio
Preto, o produtor saberá, por exemplo, como fazer para que a pecuária conduzida
por ele seja mais eficiente e quais dietas devem ser utilizadas. “O produtor
também terá acesso a novos produtos e processos desenvolvidos. Tudo que
acontecerá, desde o primeiro plantio, será demonstrado ao produtor. Tanto que tudo
estamos gastando para fazer o plantio do sistema de integração e a
rentabilidade em cada área estará disponível. É uma forma dele ver os
benefícios de implantar novas tecnologias em sua propriedade”.

TIRE
SUAS DÚVIDAS
O que é o sistema integração lavoura-pecuária-floresta
(ILPF)?
Como o próprio nome diz, consiste em
uma estratégia de produção que integra, em uma mesma área, diferentes sistemas
produtivos: agrícola, pecuário e florestal. A ideia é otimizar o uso da terra,
diversificar a produção e tornar a pecuária mais sustentável.
Contudo, existem outros tipos de
integração:
ILP– Integração
lavoura-pecuária: sistema de produção que integra o componente agrícola e o
pecuário em rotação, consórcio ou sucessão.
IPF– Integração
pecuária-floresta: integra o gado e a floresta, com objetivo de uma pecuária
com menos carbono.
ILF– Integração
lavoura-floresta: integra a floresta e o componente agrícola,
como soja e milho.
ENTENDA
Um dos principais benefícios da
integração é reduzir a emissão de metano pelos bovinos
1)A digestão do capim, alimento
rico em fibra, depende da ação de microorganismo que vivem no rúmen – um dos
quatro compartimentos do estômago do animal
2)Os microorganismos conseguem
quebrar a celulose e a hemicelulose, presentes na fibra, assim como outros
carboidratos não fibrosos, por meio da fermentação. Os carboidratos são
convertidos em ácidos voláteis (ácido acético, propiônico e butírico), que são
as principais fontes de energia do bovino.
3)Durante o processo de
fermentativo é gerado metano, que é liberado no ambiente pelo arroto do animal
e, em menor escalada, por flatulência
60 quilos de metano, é a quantidade
liberada por um boi anualmente, segundo
a Embrapa
NA
FLORESTA
Por meio da fotossíntese, o gás
carbônico emitido pela pecuária é neutralizado
Normalmente, a espécie arbórea
inserida é o eucalipto, a partir de corredores de florestas entre o pasto e a
plantação.
NA
PECUÁRIA
A presença da floresta proporciona
mais conforto térmico e bem-estar-animal
O gado pode ganhar peso em quase
metade do tempo, principalmente, por conta do conforto térmico feito pelas
árvores.
NA
LAVOURA
A diversificação de culturas deixa o
solo mais rico em nutrientes e produtivo
A colheita das lavouras anuais
enriquece o solo do pasto com matéria orgânica, permitindo o plantio direto
A integração preserva a biodiversidade
e otimiza a utilização de recursos naturais
Aumento da renda líquida, permitindo
maior capitação do produtor
Estabilidade econômica com redução de
riscos e incertezas devido à diversificação da produção
Melhoria do bem-estar do animal em
decorrência do maior conforto térmico
Mitigação das emissões de gases
causadores do efeito estufa
Melhoramento da qualidade e
conservação das características produtivas do solo
FAZENDAS
SUSTENTÁVEIS
1700
Na Europa, desde a Idade Média, são
conhecidas várias formas de plantios associados entre culturas anuais e
culturas perenes ou entre culturas frutíferas e árvores madeireiras. Sistemas
integrando árvores frutíferas com a produção pecuária datam do século XVI, e,
aparentemente, uma das causas do seu quase desaparecimento foi a mecanização.
1800
O sistema de associar as culturas foi
copiado da natureza pelos indígenas e, posteriormente, transferido aos
colonizadores. Nos trópicos, o exemplo mais marcante vem dos pequenos
agricultores, ao praticarem variados sistemas de consórcios de culturas.
1900
Historicamente, os imigrantes europeus
trouxeram para o Brasil a cultura da associação entre agricultura, pecuária e
florestas, que, desde o início, foi adaptada às condições tropicais e
subtropicais. Porém, com o surgimento das máquinas o modelo foi parado de ser
utilizado.
1970
Alguns esforços para reverter o
processo de degradação dos solos foram iniciados no final da década de 1970,
com a adoção de sistemas de terraceamento integrado em microbacias
hidrográficas e o desenvolvimento de tecnologias para compor o sistema plantio
direto (SPD), principalmente no Sul do Brasil.
1990
No final dos anos 1990, propostas que
envolveram o uso de sistemas de ILP voltam a ganhar força. A forragem produzida
na entressafra contribuía para a cobertura do solo e acúmulo de palhada para o
cultivo em sucessão de grãos em sistema de plantio direto.
2000
Já nos anos 2000, a demanda por
madeira e a necessidade de melhorar o conforto térmico para os animais levou à
inserção do componente arbóreo nos sistemas. Outros benefícios, como a proteção
contra vento e geadas e o sequestro de carbono intensificaram o interesse por
esses sistemas de integração.
Por
Rone Carvalho
rone.carvalho@diariodaregiao.com.br
Leia matéria do Diário da Região na íntegra: https://www.diariodaregiao.com.br/cidades/riopreto/rio-preto-ganha-fazenda-modelo-para-reduzir-emiss-o-de-gases-do-efeito-estufa-na-agropecuaria-1.1051648
Fonte: Embrapa.
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